OPINIÃO 65 de noção das consequências ambientais do uso insustentável dos recursos naturais, ou desconhecimento de que emmuitos casos o impacte ambiental negativo pode ser irreversível. Não são as obrigações ambientais que estão erradas. Não é a avaliação dos projetos e a monitorização dos processos que é desnecessária. A duplicação de requisitos, a demora na emissão de pareceres vinculativos ou nas respostas por parte das autoridade e entidades competentes é que temque ser revista. Entenda-se que esta proposta de diploma, na prática, pretende esvaziar as empresas de competências legais ambientais, iniciando uma reforma de simplificação dos licenciamentos existentes, através da eliminação de licenças, autorizações, atos e outros procedimentos, que é capaz de ser a continuação da tomada de decisões completamente alheias à realidade portuguesa, ao panorama ambiental atual e à conjuntura internacional. Esta proposta de diploma chega com boas intenções de resolver um problema existente nos licenciamentos, mas de forma desconcertante propõe mudanças que não fazem sentido do ponto de vista técnico. Estamos a falar de um projeto de diploma que prevê, no âmbito do regime de prevenção e controlo integrado de poluição (PCIP), concretamente a eliminação da participação de entidades acreditadas na instrução dos procedimentos de licenciamento para obtenção de licença ambiental: “eliminação da participação de entidades acreditadas na instrução dos procedimentos de licenciamento para obtenção de licença ambiental e esclarecimento de que a utilização de verificadores acreditados para o reporte de informações por operadores de instalações sujeitas ao regime de prevenção e controlo integrado de poluição é meramente facultativo”. Resumindo, o que esta proposta de diploma propõe é que os estabelecimentos sujeitos ao controlo do processo PCIP, unidades classificadas desta forma pelo elevado impacte ambiental – responsáveis por emissões gasosas e líquidas, produção de resíduos perigosos, armazenamento de sustâncias perigosas, passem desta forma a ter um controlo ‘facultativo’. É que ‘facultativo’, que tal como ‘recomendação’, é daqueles termos que todos sabemos que, principalmente nos tempos de dificuldade que todos atravessamos, não funciona quando queremos controlar e monitorizar processos. Continuando nesta ótica de ingenuidade romântica, a proposta de diploma avança com outras ideias completamente desenquadradas de umquadro de regulação ambiental. Vejamos a proposta de eliminação da necessidade de ‘renovação da licença ambiental, assimdeixando de ter de ser renovada ao fim de dez anos e dispensando o interessado de realizar esse procedimento’. Licenciamentos sem prazo de validade, emempresas comatividades com impacte ambiental, não podem existir. Damesma forma que não pode existir um modelo de comunicação prévia, ou renovação de licenças de utilização automáticas, em substituição da licença, quando falamos da utilização de recursos hídricos, mesmo que seja emmalha urbana. Talvez os prazos devammudar, talvez as respostas das autoridades responsáveis devam ser mais céleres, o que não pode acontecer é deixar de existir controlo e acompanhamento num quadro ambiental. Esta proposta não deixa de nos surpreender até à última linha. Nomesmo documento chega a ser apresentado a sugestão de reduzir os casos de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) obrigatória fora das áreas sensíveis, assim como reduzir os casos onde é indispensável mesmo a sua realização. A ferramenta de AIA não pode ser encarada como um exclusivo das áreas sensíveis ou protegidas. Este instrumento é um mecanismo fundamental para avaliar um projeto em toda a sua vertente de sustentabilidade, que é aplicado para garantir que são analisados todos os parâmetros antes da sua concretização. É um dos mecanismos mais adequados para prevenir impactes ambientais, para salvaguardar a proteção da biodiversidade e o uso adequado dos recursos, assim como a gestão dos aspetos ambientais e sociais. Para quê mudar? n * Especialista na área dos Resíduos e Ambiente Doutoranda em Engenharia do Ambiente no IST Fundadora e Coordenadora do SOS AMIANTO Autora do livro 'Não Há Planeta B: Dicas e Truques para umAmbiente Sustentável' Conselheira do CES - Conselho Económico e Social, pela CPADA, em representação das Associações Nacionais de Defesa do Ambiente
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