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Bombas e Bombas de Calor

Miguel Cavique, especialista em Climatização – Ordem dos Engenheiros / auditor de Defesa Nacional - Instituto de Defesa Nacional

03/07/2024

O crescimento do mercado europeu de bombas de calor foi de cerca de 12% ao ano entre 2015 e 2020, aumentando depois para taxas anuais próximas de 40% até 2022. A guerra veio dar nova importância estratégica ao abastecimento de energia da Europa.

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A invasão da Ucrânia pela Rússia em 26 de Fevereiro de 2022 veio mostrar uma realidade já vaticinada por alguns autores. A ocupação da Transnístria na República Moldava e da região do Donbass na Ucrânia foram prenúncios de uma acção militar da Rússia sobre a Ucrânia.

O velho aforismo que a paz se alcança com relações económicas voltou mais uma vez a mostrar-se fraco. Desde a queda do muro de Berlim em 1989 que o mundo ocidental, Europa incluída, tenta criar ligações económicas profundas com a Rússia. Ângela Merckle, enquanto chanceler da Alemanha, criou uma forte dependência do gás russo com suposto benefício mútuo – a Europa recebia gás de um vizinho próximo e a Rússia recebia o valor da exportação de gás enviado por diversos pipelines para a União Europeia (UE). Ainda em 2022 estava em construção mais um pipeline de ligação da Europa à Rússia através da Escandinávia, o North Stream 2. Antes da invasão, o peso da importação de gás natural (GN) da Rússia, por pipeline e liquefeito (GNL), era de cerca de 60%. A dependência da UE-27 da energia da Rússia era em GN de 37%, 25% de petróleo e 20% de carvão.  

Mas ao desejo europeu de interdependência sobrepôs-se o desejo russo de alteração da ordem mundial. A estratégia Primakov (1990), definida logo após a queda do muro de Berlim, pretendia implementar relações internacionais de soma zero - uma atuação deve originar um benefício para um lado à conta do prejuízo do outro. A Rússia quis contrapor ao modelo bi-polar do mundo dividido entre o Ocidente e a China, um mundo multipolar, com contornos variáveis, onde a Rússia possa ter influência na Ásia através de aliados como o Irão, China, e eventualmente Índia como então se falou.

Face ao conflito, mais rápido do que se esperava, a Europa conseguiu responder à escassez de gás e em 2023 o GN russo já só representava 16,8% das importações de GN. A Europa reduziu o consumo de GN em 13%; a Noruega acedeu a aumentar as exportações de gás para a Europa, representando agora cerca de 30% do gás importado pela UE. A Alemanha fez terminais metaneiros, reactivou provisoriamente centrais a carvão, e apostou em sistemas renováveis.

O papel da Europa no mundo vai alterar-se. A ideia de uma articulação do seu soft-power com o hard-power dos Estados Unidos parece esfumar-se. A China tem mostrado que os EUA têm uma frente Asiática mais importante, que a Ocidental. A Détente 2.0, entre os EUA e a China, preconizada por Kissinger há poucos anos será bem mais difícil de realizar, que a anterior entre EUA e a URSS. Os EUA quererão ganhar tempo e afastar as possibilidades de conflito com a China. A UE terá de se empenhar na resolução dos seus próprios problemas. Desde a administração Obama que o centralismo americano se mantém. O realismo político voltou às relações internacionais.   

Um dos problemas da ordem do dia da UE é a segurança de abastecimento de energia. Os EUA conseguiram resolvê-lo nas últimas décadas com o recurso às areias betuminosas e ao gás de xisto, a par de um enorme esforço de racionalização do consumo de energia. A UE dispõe de reservas de carvão, altamente poluentes, e em muito menor escala de petróleo e de gás.

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Qualquer bloco pretende ter energia a preços acessíveis, de fontes locais e preferencialmente sustentáveis. Os sistemas renováveis são tendencialmente sustentáveis, têm produção local, ou seja, garantem a segurança de abastecimento e competem cada vez mais em preço com as soluções clássicas. O recurso à electrificação global permitirá a utilização de energia eléctrica produzida localmente, de redes nacionais, ou internacionais. Por 2050, os edifícios das economias desenvolvidas dependerão em 75% da electricidade. Concomitantemente, o consumo de GN reduzir-se-á. A UE deverá optar por um modelo energético assente na distribuição de energia eléctrica.    

Neste contexto, as bombas de calor (BC) aparecem como solução renovável.  As BC extraem energia ao ambiente, que elevada a uma temperatura mais alta, pode ser usada em aquecimento. Acresce que a electricidade usada nas bombas de calor pode primordialmente vir de fontes renováveis, como aliás já acontece no caso de Portugal.

Os valores de SCOP das bombas de calor são hoje superiores a 3,0 representando na média anual a produção de três unidades de calor por cada unidade de energia eléctrica introduzida. O fator de conversão da energia eléctrica é ainda definido em 2,5, correspondente ao rendimento de 40% do parque electro-produtor. No caso português, mais de metade da energia eléctrica provém de fontes renováveis (e.g. barragens, fotovoltaica e eólica), pelo que o rendimento médio do parque eletroprodutor de fontes importadas ou fósseis é de cerca de 80%, correspondente a uma eficiência média de aquecimento de 240%. Esta eficiência torna as bombas de calor unidades de elevado interesse na substituição de fontes não renováveis, nomeadamente o GN.

Portanto, há um interesse duplo na utilização de bombas de calor, a elevada eficiência e a baixa dependência de fontes energéticas importadas. O crescimento do mercado europeu de bombas de calor foi de cerca de 12% ao ano entre 2015 e 2020, aumentando depois para taxas anuais próximas de 40% até 2022. A guerra veio dar nova importância estratégica ao abastecimento de energia da Europa.

O parque instalado de BC na UE-21 era em 2022 de cerca de 20 milhões de unidades – só no ano de 2022 foram vendidas três milhões de BC. Este mercado permite a redução de emissões em 7,4 Mton de CO2 equivalente por ano. Garante ainda emprego na UE a 164 mil homens-ano. Segundo as previsões da EHPA, este mercado irá crescer cerca de quatro vezes até 2030, e o sub-setor de máquinas ar-água deverá crescer seis vezes no mesmo período.

No entanto, o mercado das bombas de calor retraiu 5% no ano passado. Mas, mantêm-se as condições para a evolução estrutural deste mercado. Em contraponto, existem entraves à proliferação de bombas de calor, que poderão fazer diminuir o mercado: o custo inicial é maior que uma caldeira, pelo que o período de amortização do investimento exige utilização frequente; existem entraves físicos, como espaços para colocar os aparelhos e obras a realizar em casa; factores estéticos a incorporar na introdução das BC; e hábitos locais e culturais.

Os países da UE com maior utilização de BC são a França, Alemanha, Itália. A França e Itália utilizam sobretudo BC ar-ar. Em Portugal, as BC são quase exclusivamente ar-ar. A tendência de proliferação de BC está igualmente a ocorrer nos EUA e no Canadá. 

Do que foi dito, existem condições para um grande desenvolvimento do mercado de bombas de calor na UE. A sua utilização está alinhada com a proposta da Comissão Europeia de independência de combustíveis fósseis Russos garantindo sustentabilidade, custo acessível e segurança de abastecimento.

A utilização das bombas de calor está alinhada com a proposta da Comissão Europeia de independência de combustíveis fósseis russos garantindo sustentabilidade, custo acessível e segurança de abastecimento.

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