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Artigo exclusivo da APREN para a edição de abril da revista O Instalador - Dossier dedicado ao hidrogénio

Hidrogénio renovável e o seu potencial na descarbonização da economia

Madalena Lacerda e Susana Serôdio | APREN20/04/2021
Hidrogénio renovável. Um tema que tem sido o foco das atenções e mediatismo nos últimos tempos, e que vê hoje um rápido crescimento pela Europa e por todo o mundo. Mas porquê esta atenção acrescida?
Foto: Grupo ISQ
Foto: Grupo ISQ.

O hidrogénio constitui o elemento químico mais leve e abundante do Universo, e é hoje utilizado, recorrentemente, nas indústrias química, de refinaria, metalúrgica, entre outras. Contudo, este hidrogénio é essencialmente produzido a partir de processos termoquímicos, como é o caso da reforma a vapor do gás natural e gaseificação de carvão, processos estes fortemente emissores de gases com efeito de estufa (GEE). A título de exemplo, na Europa, esta conversão é responsável pela emissão anual de 70 a 100 milhões de toneladas de CO21 , o que é mais do que Portugal emite num ano.

Existe, contudo, uma outra via para a produção de hidrogénio, que carece de quaisquer emissões de GEE, e que por essa razão tem estado em primeiro lugar na agenda e estratégia europeia para a descarbonização: a sua conversão via eletrólise da água, com recurso a eletricidade renovável. Esta solução torna-se cada vez mais relevante à medida que assistimos a um inevitável reforço da ambição climática e uma vez que o hidrogénio, como vetor energético, pode ainda ser utilizado em outros fins múltiplos substituindo diretamente o uso de combustíveis fósseis ou servindo de portador de energia assumindo a função de armazenamento.

De facto, espera-se que a eletricidade renovável descarbonize grande parte dos consumos energéticos da UE até 2050, mas não todos. O hidrogénio renovável constitui uma solução para preencher parte dessa lacuna, podendo ser usado para armazenamento sazonal de eletricidade renovável, ou enquanto matéria-prima ou combustível, com aplicação no setor da indústria e da mobilidade e em segmentos industriais que requerem processos de alta temperatura e/ou requeiram chama proveniente de combustão com elevada densidade energética. Para além disso, esta solução constitui uma via para o reaproveitamento ou reutilização de grande parte da infraestrutura de gás natural existente e hoje subaproveitada.

Dado o papel fundamental que o hidrogénio pode representar para a descarbonização da economia, a Comissão Europeia apresentou recentemente, a par com outros Estados-membros, incluindo Portugal, a Estratégia do Hidrogénio para uma Europa com Impacto Neutro no Clima. Esta define que a participação do hidrogénio na matriz energética da Europa deverá crescer de menos de 2% para 13-14% até 2050. Tem ainda como prioridade a promoção do hidrogénio renovável, maioritariamente oriundo de eletricidade gerada a partir de centrais eólicas e solares, uma vez que esta constitui a via mais compatível com a estratégia europeia de longo-prazo para a neutralidade climática. Nesse âmbito, aponta especificamente para uma meta de capacidade instalada de eletrolisadores de 40 GW até 2030, para tal, a UE assume que é necessária uma agenda forte captação de investimento privado e que explore sinergias e assegure a coerência do apoio público entre os diferentes fundos da UE e o financiamento do BEI, aproveitando o efeito de alavanca para atingir mais rapidamente a um crescente aumento de eficiência com as respetivas economias de escala das tecnologias de eletrolisação já hoje disponíveis.

Hoje, nem o hidrogénio renovável nem o hidrogénio hipocarbónico (com baixo teor de carbono) são competitivos em termos de puro custo de produção em relação ao hidrogénio fóssil, com puros custos de produção estimados em cerca de 1,5 €/kg para a UE, enquanto os custos para o hidrogénio renovável estão na gama dos 2,5-5,5 €/kg1, sendo que teremos de incorporar as externalidades negativas no cálculo do custo do hidrogénio fóssil no curto prazo para se poderem comparar. Há que mencionar que o hidrogénio fóssil é altamente dependente da volatilidade dos mercados de commodities de gás natural e carbono, este último com uma forte tendência de aumento de preço, à medida que são impostas mais restrições à emissão e comercialização de licenças de emissão de CO2 no Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE), tendo registado, em fevereiro, um preço médio de 37,89 €/tCO2, 57 % acima do preço médio registado em fevereiro de 2020.

Por outro lado, verifica-se uma redução significativa dos custos produção para a solução renovável, nomeadamente, os custos de investimento e financiamento do eletrolisador já foram reduzidos em 60% nos últimos dez anos e devem cair pela metade em 2030 em comparação com os dias de hoje. Para além disso, outros fatores podem ser cruciais à redução do custo da conversão de hidrogénio via eletrólise. Destaca-se também o aproveitamento de subprodutos do processo, como o oxigénio, que pode ser vendido para várias utilizações e setores, como por exemplo, no setor da saúde. Há ainda que considerar os custos associados ao transporte do hidrogénio, que totalizam hoje cerca de 0,15-0,25 €/kg por 1000 km para nova infraestrutura dedicada2, fator que favorece, sempre que possível a produção local, contribuindo significativamente para a redução dos custos de produção de hidrogénio.

Sabe-se ainda que mais de 50% do custo operacional de produção de hidrogénio está associado à eletricidade necessária para o gerar, o que torna esta solução especialmente interessante em regiões onde a eletricidade tem baixos custos de geração – próximos dos 20 €/MWh. E é aqui (e não só) que Portugal se destaca.

Sabe-se que mais de 50% do custo operacional de produção de hidrogénio está associado à eletricidade necessária para o gerar, o que torna esta solução especialmente interessante em regiões onde a eletricidade tem baixos custos de geração – próximos dos 20 €/MWh. E é aqui (e não só) que Portugal se destaca

Portugal, para além de usufruir de uma localização geográfica privilegiada, competência no setor industrial e excelência dos recursos humanos na área da engenharia, demonstrou já uma vantagem competitiva ao nível da produção de eletricidade renovável a baixo custo, sendo disso exemplo os dois leilões de solar de 2019 e 2020. Por outro lado, é um dos países da Europa com maior incorporação renovável no mix elétrico, sabendo-se que em períodos de elevada penetração renovável o preço de mercado diminui substancialmente. Estas razões conduzem a que Portugal apresente condições muito favoráveis e competitivas para a produção de hidrogénio verde.

Assim, e com olhos postos no futuro, o Governo português decidiu, e bem, posicionar-se desde cedo a nível europeu e definir uma estratégia para promoção e crescimento deste setor, com grande potencial para crescimento no país. A estratégia prevê uma representatividade do hidrogénio verde no consumo final de energia de 5 %, uma incorporação de 10-15 % nas redes de gás natural e uma capacidade instalada de eletrolisadores entre 2 a2,5 GW, até 2030.

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Esta aposta constitui um enorme benefício, não só ao nível ambiental, conduzindo a uma poupança de cerca de 6-8 MtCO2, mas também ao nível socioeconómico. De facto, estima-se que a implementação desta estratégia possa gerar 8 000-12 000 novos empregos, para além de reduzir a balança comercial importadora do país, através de um significativo decréscimo ao nível das importações de gás natural.

Se queremos tornar reais estes benefícios, se queremos transformar Portugal num país altamente competitivo e não perder o comboio tecnológico, e ao mesmo tempo cumprir com a palavra dada, é agora o momento de atuar e de criar um quadro político e regulatório adequado que crie a necessária segurança e visibilidade para captar capital e reduzir o risco de investimento e financiamento. Neste campo, é importante que sejam criados mecanismos de estabilidade de mercado, dos quais se destacam dois exemplos já analisados ao nível europeu. Em primeiro lugar, e com enorme enfoque ao nível da política e estratégia europeia, estão os 'Carbon Contracts-for-Differences' ou CCfDs, através dos quais é paga a diferença entre o preço médio do CELE e o preço de fecho do leilão, garantindo assim um preço garantido de carbono para o projeto. Existem, contudo, outras soluções que devem ser ponderadas, como os CfDs para o hidrogénio, que estão a ser analisados no Reino Unido, e funcionam de forma semelhante a um CfD para eletricidade renovável, remunerando os produtores de hidrogénio a um preço fixo por unidade gerada, usando como preço de referência, o preço do gás natural.

Considera-se fundamental que estas soluções, e outras, sejam ponderadas e estudadas, a fim de implementar a que melhor se adeque aos desígnios de descarbonização. Independentemente da via que se opte por seguir neste campo, sublinha-se que existem ainda muitos pontos e temas por debater e alinhar ao nível europeu, nomeadamente, no que se refere às garantias de origem (GOs) para os gases renováveis, não só no que respeita à contabilização da parcela renovável quando existe consumo da rede, mas também na necessidade de serem compatíveis com a com revisão da REDII em termos do que venha a ser proposto para a definição de hidrogénio e com revisão da norma europeia CEN- EN 16325 para desenvolver um sistema de GOs preciso e confiável, que inclua o hidrogénio. Por outro lado, existe ainda a revisão ao nível europeu de regulação, que terá um impacto direto na implementação de tecnologias de hidrogénio renovável. Neste campo, destacamos a Taxonomia da UE, a revisão do CELE e das Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia. Para além disso, e sendo hoje conhecimento público de que o Governo pretende avançar com leilões de hidrogénio verde, a APREN reforça a necessidade, não só de alinhamento com as diretrizes europeias, mas também do envolvimento e participação pública e das partes interessadas aquando da criação dos mecanismos de estabilidade.

E ainda, para que consigamos olhar o futuro e identificar medidas adequadas, é imprescindível que olhemos, identifiquemos e resolvamos as atuais barreiras que possam ser impeditivas à sua concretização. A instalação de eletrolisadores requere, inevitavelmente, a instalação de mais capacidade renovável – mais de 5 GW repartidos entre solar e eólica (valor estimado por nós) -, que nunca será concretizada se os atuais problemas ao nível da disponibilidade e adequação da rede elétrica de serviço público e do licenciamento de novas centrais se mantiverem. Se o licenciamento de centrais de geração renovável convencionais é hoje excessivamente burocrático e moroso, é importante pensar como será ou deverá ser o processo para sistemas que irão integrar centrais produtoras de eletricidade e unidades industriais, e eletrolisadores, para a produção e hidrogénio. Para além disso, há que considerar que o local de produção de hidrogénio nem sempre será sitiado no local onde a eletricidade é gerada, e para garantir o fornecimento e consumo de hidrogénio renovável, deverá assegurar-se a total operacionalidade das garantias de origem para gases renováveis. Por último, é necessário analisar os custos de rede associados quando há consumo direto da RESP, bem como toda a fiscalidade inerente ao custo da eletricidade em Portugal, que pode prejudicar gravemente a competitividade do hidrogénio produzido.
Sabemos que o caminho a ser traçado é inevitável e que os benefícios são enormes. Portanto, é fundamental que mantenhamos o rumo e que não nos desvirtuemos dos objetivos que traçámos, tendo sempre em mente que para uma eficaz descarbonização, o sistema elétrico deverá ser analisado de forma integrada, tendo como base a segurança de abastecimento. Tal deverá passar por uma total eletrificação dos consumos, direta, via eletricidade renovável, e indireta, via hidrogénio renovável.

[1] Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões “Estratégia do Hidrogénio para uma Europa com Impacto Neutro no Clima”;

[2] Mainstreaming Green Hydrogen in Europe, Breakthrough Energy.

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