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Portugal decide novo Plano Nacional de Gestão de Resíduos para 2030

Carmen Lima | Centro de Informação de Resíduos da Quercus28/02/2022
A solução para os resíduos está na responsabilização de toda a cadeia, desde os produtores, distribuição aos consumidores.
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Não vamos voltar a falar de metas e de não as conseguirmos cumprir, porque haverá sempre a hipótese de argumentar que não somos os únicos nesta situação nos Estados-membros. Vamos sim falar do que está na origem do problema. No mercado nacional entram cada vez mais materiais, registou-se em 2017 e 2018 um aumento face ao ano anterior de 9,4% e 3,5%, respetivamente, atingindo um valor total de 174,6 milhões de toneladas de produtos.

Num momento em que o tema da economia circular, descarbonização, alterações climáticas e redução da pressão no Planeta estão cada vez mais na ordem do dia, em que o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, apela à adoção de medidas e ações mais ambiciosas, e a integração dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em todos os processos, esperava-se mais firmeza neste Plano Nacional de Gestão de Resíduos 2030 (PNGR2030) face ao período em que será aplicado – próximos oito anos.

Os limites de 2030 e 2050 são metas importantes para Portugal em matéria ambiental mas, apesar de parecer que falta ainda algum tempo, não podemos deixar o trabalho para o último dia. O historial da gestão de resíduos em Portugal é suficiente para nos mostrar que é mais do que urgente mudar algumas estratégias e essas passam, essencialmente, pela responsabilização. É curioso como basta observar os resultados apresentados pela gestão de resíduos não urbanos, onde a responsabilidade pela gestão, bem como todos os custos associados, são assegurados pelos produtores dos resíduos, para verificar que quando há conhecimento, informação e um custo direto, as ações necessárias são tomadas, as mentalidades ajustadas rapidamente e as metas atingidas. Vejamos o exemplo da taxa aplicada aos sacos de utilização única, em que a taxa de utilização reduziu em mais de 80%.

“O historial da gestão de resíduos em Portugal é suficiente para nos mostrar que é mais do que urgente mudar algumas estratégias e essas passam, essencialmente, pela responsabilização”

Não é admissível permitir que nos dias de hoje, um Plano que irá acompanhar a próxima década, permita a ausência de medidas fundamentais que garantam a permanência de práticas não sustentáveis no mercado nacional, que não estão em conformidade com os princípios de economia circular, nem com os ODS.
Face à análise do PNGR, propomos 20 medidas que garantam uma viragem no setor dos resíduos, em todo o seu ciclo de vida, garantindo uma maior ambição na atuação:

1. Limitar a colocação no mercado de todos os produtos e materiais não passíveis de reutilização reciclagem;

2. Incorporar no custo dos produtos o seu impacte ambiental;

3. Aplicar uma eco-taxa a todos os produtos colocados no mercado nacional;

4. Criar mecanismos para garantir a incorporação de matérias-primas recicladas e a sua regulação;

5. Definição de metas e estratégias para reduzir a incorporação de matérias-primas perigosas em materiais e produtos cuja utilização se dirija ao contato humano ou ambiental;

6. Criar e apoiar as campanhas de literacia ambiental promovida pelos produtores sobre o impacte dos produtos e destino final a dar após uso, bem como sobre interpretação de rótulos dos produtos alimentares, junto dos produtores, das associações do setor da distribuição e do canal HORECA;

7. Limitar as aprovações de financiamentos sem o cumprimento do estipulado nos planos e políticas ambientais;

8. Aumentar as campanhas de fiscalização e controlo, articuladas com as variações dos valores das matérias-primas em bolsa;

9. Regular a obrigatoriedade de incorporação de matérias-primas recicladas, cumprindo todos os critérios de proteção da saúde e segurança, numa abordagem transversal;

10. Fomentar a criação de canais de divulgação e dinamização para o escoamento de materiais e produtos para reutilização, como de materiais reciclados;

11. Definir incentivos fiscais para soluções de reutilização e reciclagem;

12. Permitir a continuidade da política de restrição das entradas e importações de resíduos encaminhados para eliminação (aterro);

13. Simplificar, desburocratizar e incentivar os canais de reutilização de materiais e produtos;

14. Limitar a possibilidade de comprar produtos não sustentáveis em compras públicas;

15. Apostar em ferramentas digitais que promovam maior informação, sensibilização e educação ambiental sobre os destinos de gestão de resíduos em Portugal;

16. Promover respostas mais diversificadas, de proximidade e ajustadas a cada região, evitando a adoção de modelos uniformes para todo o território nacional;

17. Garantir resposta para todas as tipologias de resíduos urbanos e não urbanos, ou outras tipologias de resíduos produzidos nas habitações portuguesas (como os resultantes da prestação de cuidados de saúde), mesmo que para isso seja necessário a articulação entre o setor público e privado;

18. Garantir maior apoio às soluções e estratégias de gestão de resíduos fornecidas pelas autarquias e pelas entidades que tratam e dão destino aos resíduos, quer através de informação e orientação, quer apoios financeiros para outras soluções de apoio à gestão, que não seja apenas a aquisição de contentores;

19. Garantir a uniformização dos dados resultantes da monitorização do setor entre todas as entidades do setor, públicas e privadas, de gestão e/ou regulação ou tratamento de informação;

20. Aplicar-se a responsabilidade alargada do produtor também ao fluxo dos resíduos de construção e demolição (17% dos RNU) e têxteis.

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Enfrentamos um dos maiores desafios globais do século, integrar a sustentabilidade ambiental com o desenvolvimento económico, com o respeito pela saúde e bem-estar das populações, numa articulação verdadeiramente equilibrada entre a Humanidade e o Planeta.

Para conseguir este equilíbrio, não podemos continuar o mesmo modelo de consumo já ultrapassado, ou acreditar que se aumentarmos a reciclagem dos resíduos sem diminuir o consumo de recursos naturais seja suficiente para resolver este problema ambiental. É de facto fulcral mudar as mentalidades, não só da sociedade civil, como de todos os intervenientes na economia, e fundamentalmente, nos decisores políticos – locais, centrais e nacionais.

“Este Plano assume uma importância elevada no panorama ambiental português”

A caraterização do uso de recursos e dos seus impactes é necessária para promover a adoção por padrões de consumo e produção sustentáveis, avançar com a transição para uma economia global, circular e socialmente inclusiva.

Este Plano assume uma importância elevada no panorama ambiental português. Na verdade, a produção de resíduos é a consequência do uso de recursos nas atividades socioeconómicas, com origem em diversos processos, desde o momento que estes são extraídos da natureza, até que são transformados em materiais e produtos, finalizando com o período em que estes deixam de ter utilidade e resultam em resíduos com os impactes ambientais relacionados aos seus destinos inadequados, ou mesmo aos processos de gestão. Os resíduos não dependem só dos processos produtivos, mas também dos modelos de consumo, da forma como são utilizados e de como são rejeitados após atingirem o seu tempo de vida útil, e estes deverão ser uma prioridade da política ambiental nacional, dado que contribuem direta ou indiretamente, para minimizar algumas das preocupações globais – consumo de recursos naturais, descarbonização, poluição dos rios e solo, reduzir as alterações climáticas; como atuar positivamente na criação de oportunidades de emprego e desenvolvimento local.

É preciso garantir o envolvimento e o compromisso das diversas entidades, para que a aplicação deste plano seja efetivamente integrada nas políticas ambientais e nacionais, de forma transversal, bem como na efetiva cooperação entre os diversos organismos públicos e privados, locais, centrais e nacionais.

Quando assistimos a que as taxas de deposição em aterro atinjam quase os 50% dos resíduos urbanos, o que representa que consumimos e anulamos qualquer possibilidade de recuperação de metade destes materiais com este destino, esquecendo completamente o processo circular - minimizar a sua produção e o desperdício, respeitar a hierarquia de gestão de resíduos e as suas recomendações para reutilização e recuperação, valorização ou reciclagem – mas apenas eliminando-os da nossa vista e da economia, daquela que se quer circular e verde.

É urgente agir, para que o futuro do País, da economia e do ambiente não seja cada vez mais cinzento.

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