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Informação profissional do setor das instalações em Portugal

Transição para a mobilidade elétrica: é hoje apelativa?

Henrique Pombeiro1,2, Muriel Iten1,3

1Future Energy Leaders Portugal/Associação Portuguesa de Energia

2Watt-IS

3ISQ

21/11/2022
A mobilidade elétrica tem assumido um papel relevante na descarbonização do sistema energético. De facto, as estratégias para a redução de emissões de gases com efeito de estufa, assim como a redução da dependência de recursos fósseis, têm a comum premissa da eletrificação, permitindo, deste modo, que a energia maioritariamente usada seja gerada através de fontes renováveis e, portanto, não fósseis.
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O setor dos transportes tem um peso significativo no consumo total de energia final. De facto, em 2019, este setor dos transportes representou 36,1% da energia final em Portugal, com relevância para o consumo de gasóleo (80%) e de gasolina (20%) (o gás de petróleo liquefeito, GPL, representa uma fração do consumo inferior a 1%). Reduzir o consumo de combustíveis fósseis neste setor e, consequentemente, a emissão para a atmosfera de gases com efeito de estufa é, então, uma prioridade.
No entanto, ainda existem desafios significativos que podem condicionar a mudança da mobilidade convencional, fóssil, para a elétrica, nomeadamente aos níveis económico, de capacidade da rede elétrica, de comodidade e mesmo de transparência nos impactes ambientais.

Critério económico

De uma maneira geral, o preço das fontes de energia fóssil tem vindo a aumentar e, este ano de 2022, está a ser particularmente significativo devido ao impacto do conflito da Rússia com a Ucrânia nos preços do gás natural. Esse aumento do preço dos combustíveis repercute-se também nos preços da eletricidade, significando, portanto, que se analise se o justificativo financeiro para a posse de um veículo elétrico é ou não vantajoso.

De acordo com a estrutura tarifária em vigor em setembro, por exemplo, é possível estimar o custo de carregamento de uma viatura de passageiros num posto na via pública, com 18 kWh (consumo aproximado para percorrer 100 km) pouco abaixo de 7,5 €1. Considerando um veículo semelhante a combustão interna a gasóleo, com consumos médios de 6 l/100km e com um preço de 1,7 €/l, o custo de 100 km rondará os 10 €. De acordo com este exemplo simplista, o custo de carregamento de um carro elétrico na via pública, era cerca de 25% menos que um carro a gasóleo. Esta poupança será maior no caso de o carregamento ser realizado no domicílio, pois, admitindo um preço cerca de 0,20 €/kWh, o carregamento de 18 kWh rondaria os 3,6 €. Este valor representa já uma poupança à volta de 65% quando comparado com um carro a gasóleo e seria superior considerando o carregamento em período de vazio numa tarifa bi-horária cujo preço fosse 0,12 €/kWh em vazio: cerca de 2,15 € conseguindo uma poupança que ronda os 78% face ao gasóleo.

Pelo exemplo descrito, apesar de ambos os tipos de combustível (fóssil e elétrico) serem vulneráveis à volatilidade dos mercados, verifica-se que o custo de abastecimento/carregamento é mais vantajoso nos veículos elétricos. Note-se, no entanto, que o preço médio do veículo elétrico é superior ao preço médio de um veículo a combustão interna, para uma gama semelhante. A título de exemplo, consideremos um veículo ligeiro a gasóleo que pode custar cerca de 24.000 € e um homólogo elétrico que corresponde a 33.500 €2. Considerando uma poupança média de 6,4 €/100 km no caso de carregamento no domicílio (0,20 €/kWh), teríamos um retorno do investimento aos 150.000 km. De acordo com , o que poderá, em termos práticos, corresponder a vários anos até se atingir essa quilometragem. Note-se que outros custos de manutenção estão excluídos desta análise. A viabilidade económica dependerá, assim, de fatores, nomeadamente o custo de eletricidade, que poderá, por exemplo, ser reduzido no caso da instalação de painéis fotovoltaicos em casa, reduzindo de forma significativa o custo de carregamento e reduzindo assim o período de retorno do investimento.

Adicionalmente, prevendo-se cenários de penalizações relacionadas com emissões individualizadas por km percorrido, a viabilidade económica e ambiental poderá tornar-se muito mais atrativa.

Capacidade da rede elétrica

Este possível aumento não é desprezável e será um cenário possível com o aumento da penetração de veículos elétricos no país. Embora este não seja um cenário provável a curto prazo, a cadeia de valor dos sistemas de produção/consumo elétricos terá de ser adequadamente reforçada e diversificada, requerendo-se a implementação de estratégias holísticas de gestão de energia para fins de carregamentos, de forma a atenuar este aumento instantâneo de consumo e promovendo uma distribuição ajustada ao longo do dia. Para tal, será necessária uma infraestrutura que tenha em consideração diversos fatores, em especial aqueles que se coadunam com o conforto e segurança do utilizador final.

Portugal corresponde a um dos países da União Europeia onde mais se circula de carro (ligeiros), estimando-se que em média um cidadão português conduza anualmente cerca de 9000 km3. Considerando-se que no país existem mais de 5 milhões de automóveis e assumindo-se um cenário em que haja a penetração de 1.000.000 veículos elétricos em Portugal, não será disparatado que haja necessidade de 5% deste número necessitar de carregamento em hora de ponta, a 22 kW. Isto implica um aumento da necessidade da potência instalada, nomeadamente para 1,1 GW de potência instantânea. Ora, a potência tomada média em Portugal em período de ponta é abaixo dos 10 GW4, assim este aumento é 10% da potência usada atualmente.

Comodidade

Um veículo elétrico de 50 kWh tem uma autonomia abaixo de 300 km, autonomia que está de facto ajustada às necessidades do condutor comum. O seu carregamento deverá ser assegurado no domicílio (caso o utilizador tenha essa possibilidade) ou num carregamento público. Nesta última vertente, ao dia de hoje, a rede pública de carregamento de veículos elétricos supera os 2.800 postos e este número continua a aumentar. No entanto, com o crescimento exponencial do número de veículos elétricos (promovido por benefícios fiscais, entre outros), o acesso ao carregamento tenderá a tornar-se cada vez menos cómodo e demorado, exigindo-se por vezes, o carregamento durante a noite. Esta situação é menos atrativa, quando comparada com um abastecimento convencional com a duração média de 5 a 10 minutos num posto de abastecimento de combustíveis, no caso de um veículo a combustão interna.

Adicionalmente, durante deslocações maiores, poderá haver a necessidade de efetuar o carregamento em postos de abastecimento em autoestrada, possivelmente requerendo um tempo de espera considerável (> 1 hora) no caso de existir menos elétricos do que o número de carros a necessitar de carregamento.

Transparência na análise de ciclo de vida

A grande diferença entre um veículo a combustão interna e um veículo elétrico está no uso de baterias no segundo caso e, no muito diferente impacto das emissões do combustível/eletricidade durante a sua utilização. A exploração de metais para a produção de baterias, tais como o lítio, não tem uma transparência desejável ao longo da sua cadeia de valor, mas o seu impacte local é significativo com risco de poluição de lençóis freáticos e impactes no transporte e transformação das matérias-primas em baterias.

No entanto, a bibliografia5 suporta que os veículos elétricos, apesar de apresentarem um maior impacte durante o seu fabrico, são responsáveis por menos emissões durante todo o seu ciclo de vida, ao se admitir uma matriz de produção elétrica semelhante ao caso português (em que a maioria da produção elétrica é de origem renovável). Espera-se, ainda, que os impactes ambientais dos veículos elétricos diminuam em mais de 70% até 2050.

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Análise

Tal como acontece recorrentemente, a penetração de nova tecnologia no mercado não acontece a par e passo com o desenvolvimento da infraestrutura correspondente. A infraestrutura que atualmente existe não está ainda preparada para uma substituição plena da anterior tecnologia pela nova, esperando um uso com todas as conveniências atuais. No entanto, existe um forte dinamismo de mercado que tem impulsionado as vendas de veículos elétricos, também impulsionado por políticas nacionais, e esse aumento está necessariamente a incentivar o desenvolvimento da infraestrutura adequada.

De facto, o número de postos de carregamento elétrico continua a aumentar, a rede elétrica está a ser renovada tanto em Portugal como na União Europeia e está a haver uma penetração crescente das tecnologias de produção renovável, centralizada e descentralizada, nomeadamente eólica e solar fotovoltaica. Adicionalmente, prevê-se que o custo de um veículo elétrico decresça significativamente, o que encorajará a sua aquisição.
Numa análise geral, existe atualmente algum ceticismo relativamente à mobilidade elétrica, tecnologia ainda no seu estado inicial de integração no mercado, mas perspetiva-se, de facto, que a mobilidade elétrica irá substituir a mobilidade de base fóssil. Urge, no entanto, que se tenham em consideração todas as componentes da cadeia de valor do sistema energético para assegurar não só uma transição sustentável a nível ambiental, como sustentável a nível técnico. Também, uma estratégia política que impulsione medidas diversificadas de carregamento (domicílio/público, regime diurno através de produção decentralizada e noturna através de tarifas mais atrativas), bem como penalizações por emissões emitidas por distância percorrida, permitirá um crescimento sustentável nesta mobilidade elétrica.

Em suma, a mobilidade elétrica é, de facto, um pilar na descarbonização da cadeia de valor de energia. No entanto, existem desafios ao dia de hoje que não podem ser ignorados, mas que estão a ser mitigados, promovendo, assim, a transição para a mobilidade elétrica.

Face a tudo o exposto, verifica-se que o argumento financeiro, ao dia de hoje, pode não justificar a aquisição de um veículo elétrico em substituição de um veículo a gasóleo. No entanto, se aliado à necessidade de compra de um novo veículo e aliando a produção renovável já instalada ou a instalar no domicílio, poderá tornar mais rapidamente esta opção preferencial não apenas ao nível económico, mas também ambiental.

1 https://www.deco.proteste.pt/auto/automoveis/noticias/carro-eletrico-compensa-carregar-casa

2 Preços obtidos para um Renault Clio a gasóleo e um Renault Zoe e-tech elétrico com autonomia de 52 kWh

3 https://www.publico.pt/2018/01/23/sociedade/noticia/quem-e-o-condutor-portugues-conduz-nove-mil-quilometros-por-ano-tem-carro-com-uma-decada-e-usao-diariamente-1800028

4 https://datahub.ren.pt

5 European Environment Agency, 2022, Relatório EEA n.º 02/2022, Transport and environment report 2021 Decarbonising road transport — the role of vehicles, fuels and transport demand, ISBN: 978-92-9480-473-0

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