Portugal e Espanha uniram esforços para assegurar as condições entre ambos os sistemas elétricos, e em 2007 o Mercado Ibérico de Eletricidade (MIBEL) começou a funcionar. A criação do MIBEL representou um avanço importante na convergência física, económica e regulatória dos mercados de eletricidade e trouxe vantagens aos consumidores de ambos os lados da fronteira.
Na década de 90, a Comissão Europeia deu o mote para o início da criação do mercado único de eletricidade, respondendo ao Tratado que institui a Comunidade Europeia. No primeiro pacote energético, foi apresentada a liberalização do mercado de energia na Europa, através da publicação da Diretiva 96/92/CE1, de forma impulsionar a competitividade da União Europeia e a livre concorrência do setor, bem como garantir uma maior transparência dos preços aos consumidores finais.
Posteriormente, esta diretiva foi revogada pela Diretiva 2003/54/CE2 que veio ampliar as medidas de liberalização ao introduzir regras mais rígidas para separar (unbundling) as atividades de geração, transmissão, distribuição e fornecimento de eletricidade, promovendo uma maior concorrência e transparência no mercado.
Portugal e Espanha uniram esforços neste sentido, para assegurar as condições entre ambos os sistemas elétricos, e em 2007 o Mercado Ibérico de Eletricidade (MIBEL) começou a funcionar. A criação do MIBEL representou um avanço importante na convergência física, económica e regulatória dos mercados de eletricidade e trouxe vantagens aos consumidores de ambos os lados da fronteira.
A nível operacional, o foco passou por melhorar a coordenação entre os operadores de rede e ampliar a capacidade de interligação, que seria uma ferramenta essencial para o equilíbrio entre os dois países.
Desde então, tem havido um investimento na evolução da capacidade da interligação disponível para fins comerciais, nos sentidos importador e exportador, como é possível observar nas figuras seguintes. Face à capacidade de interligação disponível, tem-se verificado um fluxo de importações e de exportações entre Portugal e Espanha quando esta solução oferece benefícios ao sistema, quer do ponto de vista de abastecimento, quer do ponto de vista económico.
Por outro lado, à medida que o compromisso europeu de descarbonizar o setor energético se tornava mais claro, também os Estados Membros iniciavam um conjunto de ações para contribuir para o desígnio comunitário. No centro da transição energética no setor da eletricidade português estava o abandono da produção a partir de carvão, anunciado ainda em 2017, para ocorrer até 20303, juntamente com o aumento da produção a partir de energias renováveis.
Da mesma forma, também Espanha planeava a independência desta tecnologia, conhecida como o meio mais poluente de produzir eletricidade, dado o fator de emissão associado à queima de carvão e ao rendimento do processo.
Apesar de ter estipulado 2023 como ano limite de fecho das centrais do Pego e de Sines, Portugal antecipou o phase-out destas unidades de produção, tendo a central de Sines sido descomissionada em janeiro de 2021 e a central do Pego em novembro de 2021.
A antecipação deste percurso para a descarbonização do sistema elétrico resultou de uma decisão maioritariamente económica, uma vez que os preços das licenças de emissão aumentaram exponencialmente a partir do fim de 20204, bem como os preços de importação de carvão5, mas também resultante do decréscimo no consumo de eletricidade durante a pandemia de COVID-19. Consequentemente, esta tecnologia deixou de apresentar competitividade no mercado ibérico, não conseguindo assegurar as necessárias horas de funcionamento para ser viável financeiramente.
Figura 3 – Evolução das importações e exportações de eletricidade, da produção de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis e da produção de eletricidade a partir de centrais de ciclo combinado a gás natural. (Fonte: centro de informação REN, REN data hub, análise APREN)
Esta realidade resulta da lógica do funcionamento do mercado pela ordem de mérito das tecnologias de geração. Dá-se o exemplo do mês de outubro do presente ano, enquanto informação mais atual, para demonstrar que as importações (cor rosa no gráfico) ocorrem nos momentos em que o preço de mercado se encontra mais baixo (linha vermelha no gráfico), por vezes próximo de 0 €/MWh, ocorrendo também em períodos de bombagem, a qual opera tipicamente em horas de preços mais atrativos, ou seja, que normalmente coincidem com horas de baixo consumo e/ou elevada geração renovável não despachável.
Atualmente, ainda existem algumas centrais a carvão em funcionamento em Espanha, tendo outras sido já descomissionadas. Ainda assim, a ambição foi revista e aponta-se para um descomissionamento de todas as centrais a carvão até 2025.
Apesar disso, o peso destas centrais não é de todo significativo, tendo correspondido apenas a 1,5% da produção de eletricidade em 2023 e 1,1% em 20246. O desenvolvimento da tecnologia solar fotovoltaica em Espanha tem sido um dos alicerces desta transição energética, representando quase 20% da produção de eletricidade aos dias de hoje, que, juntamente com as restantes energias renováveis representaram 59% da geração, enquanto a energia nuclear contou com 21% e os ciclos combinados a gás natural com 10%7, o que corresponde a um decréscimo de cerca de 5% e 40%, respetivamente, face ao período homólogo em 2023. Importa ainda referir que a produção hídrica espanhola registada em 2024 tem sido substancialmente superior à verificada em 2023 (cerca de 70%8), sendo mais um fator favorável ao recurso a importações.
Adicionalmente, o aumento do fluxo de importações, i.e., da utilização das interligações, tem levado a mais momentos de congestionamento, originando a separação entre os mercados português e espanhol. A percentagem de separação de mercados tem vindo a aumentar, tendo atingido cerca de 7% em 2024, enquanto 2023 registou 5,3% e 2022 3%9 Assim, é possível constatar que a interligação entre Portugal e Espanha traz vários benefícios para ambos os sistemas elétricos e que são necessárias mais infraestruturas de interligação para aumentar a capacidade de importação e exportação.
Neste sentido, está a decorrer um projeto que contempla o desenvolvimento um eixo entre Beariz – Fontefría – Ponte de Lima, que irá possibilitar uma redução dos custos variáveis de geração de 4 M€/ano a 29 M€/ano no horizonte 2030. É importante que os benefícios desta cooperação peninsular, concretizada pelo MIBEL, sejam evidentes e que seja claro que não é benéfico, nem sustentável, abdicar de importações e priorizar produção nacional a partir de combustíveis fósseis.
No setor da eletricidade, o caminho para a transição energética dá-se com a aposta em renováveis, flexibilidade de rede e uma visão comunitária para atingir as metas nacionais e europeias.
1 Diretiva 96/92/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 19 de dezembro de 1996 que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade.
4 https://energy.instrat.pl/en/prices/eu-ets/
5 ERSE, Commodities
6 A referência a 2024 diz respeito ao período entre janeiro e outubro do referido ano.
7 Red eléctrica, https://www.ree.es/en/datos/generation/generation-structure
8 Red eléctrica, boletín mensual, Septiembre 2024.
9 IESOE, análise APREN.
oinstalador.com
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