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Mobilidade elétrica: um novo paradigma para o transporte terrestre, marítimo e aéreo

Guilherme Marques - Future Energy Leaders Portugal / Associação Portuguesa da Energia

23/06/2025
Desde a micromobilidade urbana aos navios elétricos e aviões regionais elétricos, a eletrificação dos transportes está a redesenhar o sistema energético e a forma como nos movemos.
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A eletrificação é um dos principais vetores para a transformação energética global e os transportes desempenham um papel crucial neste processo. Em 2022, o setor dos transportes foi responsável por cerca de 25% das emissões totais de gases com efeito de estufa (GEE) na União Europeia, com o transporte rodoviário a representar 71,7% dessas emissões [1].

A urgência climática que vivemos, aliada ao avanço tecnológico, está a impulsionar este sistema para um novo paradigma: um ecossistema de mobilidade distribuído e interligado, em que a eletricidade se afirma como um dos principais vetores energéticos. Esta transição, experienciada a diferentes velocidades em diferentes geografias, implica reconstruir infraestruturas, repensar políticas públicas e reconfigurar cadeias logísticas.

Setores de transporte: maturidade e horizonte tecnológico

Transporte terrestre:

O transporte terrestre, quando comparado com o marítimo e o aéreo, é aquele que contribui mais significativamente para as emissões globais de CO2eq. No entanto, é simultaneamente o domínio mais avançado da eletrificação, sendo exemplo paradigmático a ferrovia, onde as principais ligações interurbanas e intraurbanas estão maioritariamente eletrificadas, tanto em Portugal, como na UE. Já na rodovia, foi possível constatar um crescimento exponencial de veículos elétricos (VE) ao longo dos últimos anos, representando 33,3% das novas matrículas em Portugal em 2024 [2].

Um dos parâmetros que melhor permite aferir o custo real de um veículo é o Custo Total de Propriedade (TCO). Este parâmetro tem em conta os custos diretos e indiretos de compra, operação e manutenção e o seu valor residual (valor de venda, habitualmente ao fim de cinco anos). Este indicador tem vindo a decrescer nos VE, aproximando-se da paridade com os veículos a combustão, especialmente nas frotas urbanas [3].

Gráfico 1. Evolução do TCO para veículos do segmento médio e compacto [4]

Gráfico 1. Evolução do TCO para veículos do segmento médio e compacto [4]

Incentivos concretos têm sido implementados para promover a adoção de VE, incluindo subsídios à compra, benefícios fiscais e investimentos em infraestruturas. A eletrificação da mobilidade urbana tem sido impulsionada por políticas públicas aliadas a modelos de mobilidade partilhada vastamente disseminados em várias cidades europeias. Em termos globais, os VEs conseguem reduzir significativamente as emissões e custos operacionais [5].

Transporte marítimo

O setor marítimo representa aproximadamente 3% das emissões globais de CO2, com um crescimento acumulado de cerca de 20% na última década, impulsionado pelo aumento do comércio internacional e pela lenta adoção de tecnologias de baixo carbono [6]. Estas emissões são particularmente difíceis de mitigar devido à longa vida útil das embarcações e à elevada densidade energética exigida em rotas oceânicas.

A eletrificação direta, através de baterias, é tecnicamente viável em contextos de curta distância e operação regular, como:

  • Ferries urbanos e inter-ilhas (por exemplo, na Noruega e nos Açores);
  • Transporte fluvial em canais europeus (ex. Rotterdam, Hamburgo);
  • Operações portuárias (rebocadores, gruas e sistemas de cold ironing).

No entanto, para rotas oceânicas e transcontinentais, a eletrificação enfrenta limitações severas devido ao:

  • Peso das baterias para longos trajetos;
  • Necessidade de infraestrutura de carregamento portuária;
  • Baixa densidade energética por unidade de massa.

Nestes contextos, destacam-se como alternativas emergentes em desenvolvimento:

  • E-combustíveis sintéticos (produzidos a partir de hidrogénio verde e CO2 capturado);
  • Amónia verde e metanol verde como vetores promissores;
  • Motores dual fuel e sistemas híbridos em fases piloto.
Recentemente, a UE implementou o FuelEU Maritime, que obriga a reduções progressivas na intensidade carbónica dos combustíveis utilizados, com metas de descarbonização até 2050, o que pressiona a indústria para uma transição gradual, embora tecnologicamente fragmentada.

Transporte Aéreo

Para voos comerciais de média e longa distância, a principal via de transição são os Sustainable Aviation Fuels (SAF) — combustíveis com origem ou biológica ou sintética [8].

Gráfico 2. Evolução das Emissões Globais por Setor de Transporte (Mt CO2e) [4,9,10]

Gráfico 2. Evolução das Emissões Globais por Setor de Transporte (Mt CO2e) [4,9,10]

Portugal: oportunidades, assimetrias e lacunas

Portugal está bem posicionado na adoção de VE com melhores níveis de adoção do que economias de maior dimensão, como Itália ou Espanha. Esta adoção tem sido acompanhada por um crescimento na infraestrutura disponível através da rede MOBI.E, que assegura mais de 6.200 pontos de carregamento [12]. Estes carregadores começaram por ser maioritariamente lentos, no entanto, ao longo dos últimos anos, foi possível registar um crescimento acelerado da instalação de carregadores rápidos e ultrarrápidos [12].

Gráfico 3. Proporção de tipo de carregador público disponível em 2024 [4]

Gráfico 3. Proporção de tipo de carregador público disponível em 2024 [4]

Um projecto-piloto interessante que se encontra a ser desenvolvido atualmente no país é a ligação interurbana Lisboa - Porto com autocarro elétrico [13].

No setor marítimo, há projetos de ligação elétrica em porto, por forma a evitar que navios de grande porte, como cruzeiros, emitam gases ou partículas poluentes enquanto atracados. Encontra-se igualmente em aberto a possibilidade de adoção de ferries elétricos para ligação inter-ilhas nos Açores.

Na aviação, embora ainda sem aeronaves elétricas, os aeroportos seguem a tendência de eletrificação de equipamentos em terra. As ligações Lisboa-Porto e Lisboa-Faro encontram-se dentro da distância admissível para um vôo elétrico, no entanto, a capacidade destes aviões não é compatível com a elevada procura existente.

Condições de viabilidade e barreiras estruturais à eletrificação

A eletrificação em larga escala enfrenta cinco grandes desafios:

1. Infraestrutura de carregamento:

- Expandir a rede pública com foco em zonas rurais e interurbanas.

- Estimular o carregamento doméstico e empresarial com incentivos e simplificação de licenciamento.

- Investir em hubs de carregamento ultrarrápido, em corredores logísticos estratégicos.

2. Geopolítica dos minerais:

- Diversificar os fornecedores de matérias-primas essenciais.

- Apoiar a extração responsável de lítio e outros minerais em território europeu.

- Criar uma estratégia europeia de reciclagem de baterias.

3. Regulação e planeamento urbano:

- Integrar metas de descarbonização nos Planos Diretores Municipais.

- Reservar espaço urbano para carregamento partilhado e mobilidade elétrica leve.

- Planear novas urbanizações por forma a contemplarem desde a origem infraestrutura elétrica para as várias vertentes de mobilidade.

4. Integração com energias renováveis:

- Incentivar o carregamento inteligente (smart charging) com base em picos de produção solar/eólica sem que isso prejudique o utilizador.

- Desenvolver comunidades energéticas com mobilidade elétrica partilhada.

- Apostar no armazenamento distribuído como complemento à mobilidade elétrica, integrando-o nas comunidades previamente mencionadas.

5. Acesso e aceitação social:

- Reduzir o IVA na aquisição de VE.

- Apoiar financeiramente a conversão de frotas de PME.

- Promover campanhas de literacia energética e mobilidade sustentável.

Conclusão

A mobilidade elétrica representa mais do que uma transição tecnológica: é uma convergência energética, digital e territorial à qual está inerente uma mudança de mentalidade. E esta mudança não implica necessariamente uma alteração do que fazemos no nosso quotidiano, mas sim da forma como o fazemos e, como qualquer mudança, requer um período de adaptação.

Portugal deve, por isso, abandonar a visão automóvel-centrada e apostar num modelo multimodal, inclusivo e sustentável, utilizando a eletricidade renovável como principal vetor energético, complementada por outras fontes sempre que necessário.

Referências

1. Parlamento Europeu. (2024). *Emissões de CO2 dos carros: factos e números*. https://www.europarl.europa.eu
2. Autovista24. (2024). *Portugal packs a punch in the European EV market*. https://autovista24.autovistagroup.com
3. Transport & Environment. (2023). *TCO comparison Diesel vs Electric*. https://www.transportenvironment.org
4. Global EV Outlook 2025. IEA. https://www.iea.org/reports/global-ev-outlook-2025
5. Deloitte. (2023). *Electrifying Last Mile Deliveries*. https://www.deloitte.com
6. UNCTAD. (2023). *Review of Maritime Transport 2023*. https://unctad.org
7. IEA. (2024). *Aviation*. https://www.iea.org
8. Airbus. (2023). *Sustainable Aviation Fuels (SAF)*. https://www.airbus.com
9. Visual Capitalist. (2022). *Life-cycle emissions of EVs*. https://www.visualcapitalist.com
10. Transport & Environment. (2024). *State of Transition Report*. https://www.transportenvironment.org
11. Mobility Portal Europe. (2024). *Portugal’s EV adoption record*. https://mobilityportal.eu
12. MOBI.E. (2025). https://www.mobie.pt/mobidata/data
13. Coach & Bus Week. (2024). *FlixBus electric route Lisbon-Porto*. https://cbwmagazine.com
14. Transport & Environment. (2023). TCO comparison Diesel vs Electric. https://www.transportenvironment.org

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